Sempre há um Peixe Maior
O motoboy corria no engarrafamento da avenida paulistana, apressado para a última entrega antes do almoço. Sua moto rugia para os carros como um cão pastor, mostrando às ovelhas quem era o chefe. Reféns da própria imobilidade, os motoristas ouviam aquele barulho poderoso se aproximando e olhavam nervosos para os lados, torcendo para terem deixado espaço suficiente entre os vizinhos de quatro rodas. Ficavam aliviados quando o inimigo velado passava zunindo; sentimento efêmero, logo dissipado por outros sons parecidos que vinham atrás, intermináveis.
O motoqueiro continuava seu caminho, ciente de sua posição privilegiada naquela estranha cadeia alimentar. Sorriu seu sorriso coberto de viseira negra, deliciando-se em apavorar aquela gente endinheirada em seus veículos lentos.
De súbito, viu algo à sua frente que alegrou ainda mais seu dia: uma BMW quase encostada ao veículo da direita, deixando um espaço apertado para sua passagem. O motorista do caríssimo carro cinza direcionara os pneus para a esquerda, tentando voltar para sua fila. Mas isso não era desculpa pra “vacilão”. O motoboy ergueu a perna e se preparou para o chute, na confiança gerada pela experiência. Gritou de satisfação quando arrancou o retrovisor do obstáculo, a peça caindo indefesa sobre o asfalto quente.
Fitou seu próprio retrovisor, na esperança de captar um vislumbre da revolta do playboy; no entanto, viu apenas um cano reluzente e comprido, que se ergueu do capô da BMW; algo atingiu a moto no instante seguinte, a explosão fazendo seu corpo voar longe. O capacete salvou seu crânio de um traumatismo, mas não o pescoço de uma fratura grave. Inconsciente, só descobriria mais tarde que precisaria escolher outro ofício. Algo que pudesse ser feito apenas piscando os olhos, por exemplo.
Após alguns instantes de estupefação, alguém de outro carro abriu as janelas e começou a aplaudir, sendo imitado por todos os motoristas que estavam próximos.
Dentro da BMW, James Bond apertou o botão que recolhia o lança mísseis, prometendo a si mesmo que nunca mais aceitaria uma missão no Brasil.
8 comentários:
Há Há Há... Muito legal. Mário, por acaso isso é resquício da sua visita à SP?? Abraço.
Rs, juro que não. Eu apenas não entendia como eles faziam pra arrancar os retrovisores, e esses dias alguém me contou. Acho que ficou na minha cabeça, pois de repente surgiu essa história, do nada. Abraço.
Mto boa história kk'
Pô... gostei muito! Bem escrito, intenso, curto e prazeroso de se ler. Muito bom mesmo! Parabéns! Gostei muito da idéia. O fim do motoqueiro foi triste, mas cá entre nós... foi um destino procurado... como acontece muito por aí sabia?
Abraços Lendários.
Dean.
Ele tinha licença para matar!
=)
Geraldo de Fraga
Ah, tem vezes que eu também queria uma, Geraldão. ;)
Valeu Dean! Pois é, quem procura acha, rs.
James Bond?!!
Fala sério,eu ri muito disso cara!
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